sábado, 31 de dezembro de 2011

Prefiro meu quarto



Último dia do ano
para alguns.



(Pouco me importa calendários.
Não ligo para medidas.
Não ligo para datas.
Pouco me interessa esse contágio de comemorações.
Me interessou ontem a breve alegria 
do empacotador surdo-mudo
de um supermercado aqui perto.
Ganhou um real da minha mãe.
...
Tem algo muito errado no sinônimo de sociedade.)



Não quero planejar coisa alguma.
A planta do "propósito divino" deveria bastar como análise.
E vocês realmente não ligam pra isso.


Prefiro viver esta tarde no sossego de minha brisa
concisa e imprecisa.
Ainda consigo ouvir o canto dos pássaros.


Este povo é surdo
e planeja demais, por isso se frustra.
Fazem planos os que não são plenos.


Pianos pesados que não tocam os corações!


Em panos quentes caminha a humanidade 
vencida...


O dia está cinza
- nublado como meu ser.
Eu preciso merecer minha xícara de café.
Eis minha real preocupação de hoje. 


Leio meus livros
e escrevo minhas bobagens.
Mais idiota que eu
só os que soltam fogos de artifício
e que tanto perturbam meu precioso silêncio.


Suntuosa véspera do ano-novo.
Algumas ignorâncias jamais mudarão.




Ígor Andrade

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segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Resistência



Antes do fim do dia
- um pouco depois de acordar -
tudo é espanto.
Hoje na gruta das vaidades
o grito é um pranto.
Prato pronto 
de quem se acostumou com sofrimento.
A agonia é a poeira do dia
que inspira o espirro.
Mundo sujo!
Não posso me perder
sobretudo em mim.
Sou o que tenho
em unicidade catastrófica.
Permaneço entre o meu nascimento e a morte.
Meu norte é qualquer lugar.




Ígor Andrade

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sábado, 24 de dezembro de 2011

Desilusão



Há um frio no meu verão!
Suor e lágrima conspiram guerra.
Do ventre de alguma mãe perdida
até o cérebro de algum maldito
ódio e destruição ganham o caminho.


Ao longo tudo que é juízo é curto.


Desperto meu corpo numa quimera
que me era sono
e agora é um fim







l.




Ígor Andrade

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terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Gray 2



Chove
lá fora.
Aqui dentro.




Ígor Andrade

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domingo, 18 de dezembro de 2011

Não quero sentido



Não sei onde começa minha poesia e termina o domingo. Também pouca importa. Preciso caminhar na rua e tentar encontrar uma vida que não seja a minha. Porque eu sou um cão vadio. Urino em cada poste de cada esquina de cada rua de cada eu. Espio qualquer horizonte com atrevimento. Onde quer que esteja um verso perdido eu hei de encontrar. E hei também de esquecer os conflitos domésticos dos meus vizinhos. Pai que bate na filha, marido que bate na mulher. A ignorância humana se resume a um cargo de juiz. Mais lamentável ainda é um poeta o julgar. E por falar em homens, por que não falar em pássaros? Um pombo aprendeu a atravessar a rua porque o céu estava meio atravessado. Ponto. Monto um quebra-cabeça por hora. O que tenho agora é a rua do domingo e eu. E a senhora com bobes na cabeça, passeando com seu yorshire, que parece ter mais coragem de morder do que qualquer valentão que conheço. Passo em frente a um edifício chamado de "amor perfeito". Talvez o idealizador do projeto, engenheiro e arquiteto tenha sido Khalil Gibran. É, talvez eu não fizesse melhor. Mas pelo menos carrego comigo um pacote de bolachas e uma garrafa d'água. Preservo minha amizade com mendigos do meu bairro. Hoje conversei com João que era professor de português, e perdeu tudo pro alcoolismo. E assim caminha a humanidade, enquanto eu e João conversamos sentados na calçada quente. Mente quem diz que inventou alguma coisa. Quem inventou a psicologia foi João. Sem mais. Mas será que todo mundo já não era psicanalista antes de Freud, ou marxista antes de Marx, ou evolucionista antes de Darwin? Será? Serei lembrança de qualquer forma. E do outro lado do mundo um labrador chamado Thor uiva uma tempestade. E entre os ventos eu não sei ainda onde começa meu domingo e termina minha poesia.




Ígor Andrade

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sábado, 17 de dezembro de 2011

Varanda



Olho o povo
lá embaixo
bebendo e gritando
e mostrando os dentes
e não sei sinceramente
quanto de mim ainda aguenta
não enxergar uma calçada vazia.


Houve um dia
que também sorri e bebi
e caí no meio da rua.


Hoje um idiota
olha pro sábado
e não sabe se tem fim.




Ígor Andrade

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Simples assim



Se a pessoa não me traz paz
me faz
guerra.




Ígor Andrade

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Mais nada



O sábado não sabe de mim.
Ou sabe e se faz de doido.


Acordo
com a corda no pescoço.
Sufoco
no calor do dia
e na distância da noite.


Não consigo ser mais o que era antes.
Também nada do que era antes é a mesma coisa.
Só um estúpido como eu não percebe quando tudo está se perdendo.


Acordo depois do almoço
sem fome.
Não sei o quero hoje da vida
nem pro meu estômago.


Sou céu e inferno ao abrir os olhos...


O que querem de mim, os outros?
O que querem os outros, de mim?
O que eu não quero, de ninguém?


Me consolo na ilusão de que alguma mulher me espera em sua cama.


Me desconsidero ao pensar que alguém se importa ainda
com alguma coisa que eu queira dizer.


Hoje levantei meio desorientado
e quero tão somente anoitecer.
Mais nada.




Ígor Andrade

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quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Tipo o quê?



Existir e encontrar
algo que valha a pena.


Um objeto ou coisa que serve 
ou se usa para produzir outro 
igual ou semelhante.


Um ego e um eco
na última prateleira da estante.
Instante da criação.


Tipo semente.
Tipo tu ou eu.
Tipo o que alguém esqueceu.


Ou tipo nós.


Tipo o laço.
Tipo o cansaço
da madrugada.


Tipo tudo.
Tipo nada.


Tipo a palavra amada.


Para cada tipo de algo
eu vejo uma nova percepção.


Percebo os tipos de sujeitos
antes de perceber predicados.


Existir e encontrar
algo que não seja poesia
é muito difícil pra mim.




Ígor Andrade

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quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

A praia perto (Natal, sexta-feira, 02/12/11)



Aqui de frente pro mar
e de costas pro mundo.


(E antes que um imundo
me venha com um trocadilho barato,
indico cerveja barata
e talvez Freud
e talvez cocaína,
porque sou um imbecil
que fala do que não conhece...)


Aqui nesta varanda
compreendo os anos
que estão por vir.


As ondas
vêm
e vão...


Um casal no calçadão
finge esquecer do mundo 
(também).
O mundo finge esquecer
de nós.


O abismo entre ser
conhecedor
de alguma dor
e não conhecer
dor alguma.


A cor da noite
que lembra o lar.


O mar.
Amar.
Qualquer nós.


Mais uma cerveja
porque minha casa
é onde escrevo.




Ígor Andrade

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quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Lágrima


Um dia 
que se resume em tristeza
também tem beleza.




Ígor Andrade

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segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

De Fortaleza pra Natal (sexta-feira, 02/12/11)



Saio de casa nesta manhã
sem amanhã

e cheio de ontem.

Calculo quinhentos e tantos quilômetros
que passarei tentando imaginar
um processo de cura nesta viagem.

Cura de não sei o quê
numa distância de não sei pra onde.

Passo horas
numa estrada interminável
num calor miserável
e sinto medo do horizonte.

Sou pequeno demais...

Esqueço
por uns momentos
da minha tacofobia
mas a acrofobia não me deixa.


Hosana nas alturas!
E não me interessa o significado disso.


Eu sabia que ia ser difícil sair de casa
e também sabia que deveria me enfrentar menos.
Qualquer mais é um perigo
pra quem não sabe determinar valor.


Animais mortos na estrada.
E eu não sei o que é viver!


O homem e a estrada
sem fim.
O homem e a estrada
sem mim.
O homem e a estrada
enfim.


Quase posso tocar o céu
em algum momento.


Meus olhos são minha poesia.
Palavra quente e fria 
que ainda vai me matar.


Quantos buracos são necessários
para preencher o meu vazio na estrada?


Quantos vazios são necessários
para preencher um buraco da estrada?


Estou só o pó.


E antes de Mossoró
tenho um nó 
na garganta.


Lampião sorri no inferno.


Cidade aberta
alerta atenta
artéria aorta
transporta a carcaça morta
de um homem cansado.


Tráfego...


Circulo perdido em mim.


(Por algum motivo
lembro da música "Strawberry Fields Forever"
lembro de Lennon
e lembro dos meus cães.
A saudade de casa é uma ansiedade sem cura.
Dura por uma vida inteira de milionésimos de segundos.)


Horas de viagem
e caminhões.
Horas de viagem
e nascimentos.
Horas de viagem
e eu não chego nunca.


Agora entendo o surrealismo de Salvador Dali,
o grande salto da humanidade
e o deslocamento desnecessário.


O mato seco
seca a vista.


Pedras pedras pedras.


Sou uma pedra que nem saiu de casa ainda...






Ígor Andrade

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segunda-feira, 28 de novembro de 2011

(Des)esperança

Para o meu irmão Thiago Andrade.

O desencontro é um encontro
com a distância.

Não se chega a lugar algum
quando o lugar algum
parece mais próximo
do que o desejo real de busca.

Desespero
mas espero
algo novo.

O velho se cansa
e de tão velho me cansa.

Descansa
em mim
alguns sonhos
que ainda não tive.

Me prometo a reconciliação irreconhecível
diante da incomensurável ausência de paz.
Te prometo tudo
que eu puder mais.

Sou capaz
de mover o mundo -
o meu e nosso mundo
com a palavra certa
na hora errada.

Desesperança mesmo
é quando ignoro o desamor.

Os frutos verdadeiros nascem
sob o adubo do sangue do irmão;
este outro ser que também sou
e não me abandona.



Ígor Andrade

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domingo, 27 de novembro de 2011

Declaro quatro amores

Declaro quatro amores:

Um já enterrado na casa perto da praia.
Onde a brisa fria alisa o túmulo.
Cúmulo da saudade embaixo da terra.

(Hoje deveria chover...)

Outro amor eu guardo no peito.
Aquele silêncio do predicado antes do sujeito.
Norma clara do padrão escuro feito pra confundir.
Obra-prima-filha-e-mãe do tempo.

(Lembrança é calor!)

Um terceiro amor ainda não nasceu
mas já o declaro por pura agonia.
Me afobo quando amo -
qualquer coisa que seja antes do nascimento
e sobretudo reclamo
todo o vazio que é solidão.

(Domingo é um berço estranho.)

O último amor
eu chamo de primeiro
que pode ser segundo ou terceiro
e veio antes de mim.
Fantasma, vício ou virtude...
Amplitude máxima dessa existência
que é uma insistência no ódio.

Silêncio...
Declarar é o ópio imbecil do pobre sentimental.

(Antes da noite
nesta tarde miserável
uma cadela prenha
uiva as penúrias da teimosia da raça.)

Declaro amores pro invisível
e antes de qualquer questionamento
declaro que não amar deve ser melhor.



Ígor Andrade

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quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Desde que amanheceu

Desde que amanheceu
eu já era noite.

Notei isso hoje.
Sempre me atraso
em minhas conclusões.

Toda a beleza da minha ignorância
é suplantada na minha falta de compromisso
com a vida.

Amanheceu já há meio dia
e eu ainda não acordei.
Meio que via
tudo se perdendo
como sempre.
Meio que lia
Neruda
de cara pra janela.

A rua hoje está medonha
de tão silenciosa.

Os poemas buzinam
pro meu juízo andar.
Escuto o semáforo
que me pede atenção.

Sou aquela exatidão de dúvidas.

Desde que amanheceu
eu sou saudade.
É isso!



Ígor Andrade

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domingo, 20 de novembro de 2011

Alprazolam

Apraz
o foz
a paz
o pós
sem nós
que jaz
no jazz
sem blues
nem voz.



Ígor Andrade

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Quatro horas da manhã

Quatro horas da manhã.
Não consigo dormir.
Não consigo dormir.
Não consigo.

Meu peito carrega uma manada galopando desgovernada pro sul.

Apolo sem colo treme no solo da solidão...

O pânico é o irmão
e é também a cara
do antes de amanhecer.

Engasgo com um poema com gosto de sal.
Estou mal
mas passa.

Devassa devassa devassa
madrugada.

Não consigo dormir.
E não consigo esquecer.
Eu me sinto abandonado.
(Mas por quem?)
E sei que é triste aceitar isso.

Não consigo dormir.
E sinto saudade de quem nem conheci direito.

Meu peito.
Meu peito
meu.

Algo se perdeu
em alguma filosofia
de quem se acha.

Nada agora se encaixa
na metafísica desse silêncio.

A borboleta que bate asas em Tóquio
e toda a loucura da teoria do caos.

O cão
chorando no quintal do vizinho.

Escrevo sozinho.
Escrevo sozinho.
Escrevo sozinho.

O canto adiantado do primeiro passarinho.

Eu não entendo mais nada.
Eu nunca entendi nada.
Eu.

Algo se perdeu
em mim
e parecia nós
e parecia um laço.

Disfarço dor com verso
e sem cor o verbo
conjuga todo tempo errado.

Não entendo de palíndromo
e não consigo dormir.



Ígor Andrade

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sábado, 19 de novembro de 2011

Madre

Para minha preciosa mãe Rejane Maria e minha querida tia Regina.

Passei algumas horas
tentando encontrar as horas
e as palavras certas
para tentar explicar
o amor de um filho.

Não consegui
e nunca conseguirei.

O amor nasce com a gente
e depois ganha o silêncio...
O amor reside no útero
mesmo depois de vazio.

Sempre seremos semente
que não cresce direito
sem os cuidados da mãe.

Sempre seremos outra coisa
que vocês não imaginam.

(Me tornei poeta só pra dizer que amo de uma forma diferente...
Acho que é isso!)

Acho
de qualquer forma
que o verbo ser
é a forma mais pura
de dizer que fomos
e somos
ainda de vocês.

Um passeio sobre as palavras
e eu passo a entender
toda a importância da gravidez.

Eu passo e passei horas...

Passar horas
aliás
pensando na beleza da maternidade
causa frio,
aponta estudo.
Isto tudo
sou eu no mundo
tentando acreditar que mudo
e que nunca vou te perder, minha mãe.

A mãe deu a luz.
A mãe é a luz
de qualquer túnel sem fim.

Passei algumas horas
tentando encontrar as horas
de uma poesia parida
em meio as lágrimas.

Tudo que vejo
é o umbigo que nos ligou
em cada medida de tempo.

Tempo
tento
e eu lamento
não saber falar bonito
nem poder te dar tudo.

O nada é a única coisa
que posso prometer
antes de qualquer poema.

Antes, bem antes
ou depois desse agora
me vejo analfabeto.

Uma mãe que parece casa
encontra um poema que parece teto.

Antes feto
depois fato
nasce o tato
cresce amor.

Mais ou menos isso
que quero dizer
mas nem eu entendo.



Ígor Andrade

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quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Sala vazia

Na ponta dos pés
se fazem
os ouvidos.



Ígor Andrade

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Perto do Natal

Corro no fim da tarde
e corro além da tarde.

O fim é o fim
ou é o começo
de sei lá o quê.

Cansei as pernas
mas fortaleci a mente.
(Ou foi ao contrário.)

Atenção!

O crepúsculo também mente.
E eu pareço humano demais
quando escrevo sobre meu dia.

As crianças brincam na praça reformada
e os casais idosos caminham de mãos dadas.
Os pássaros desta praça desistiram de voar;
caminham despreocupadamente.

Troco minha poesia pelas asas enferrujadas.

Eu me deformo
nos poemas que se formam
em cada olhar perdido
alheio.

Por que corro sozinho no fim da tarde?

Eu não queria
mas às vezes sinto pena de minha solidão.

Paro na banquinha de sempre
e fico pechinchando livros clássicos de filosofia.
As livrarias também mentem
assim como o crepúsculo.

Por que anoitece em mim antes de escrever um poema desse?

Eu corro no fim da tarde.
Eu morro no fim da tarde.
Eu sou
um fim de tarde.

Escureço em mim mesmo
buscando um sol...

Perdi metade do dia
tentando evitar o sal
da comida sem gosto da secretária lá de casa.

Estou com fome
de qualquer coisa.
Qualquer coisa chega no fim
da tarde.

E sempre tenho a impressão
de que escrevo bobagens
de cara pro céu.



Ígor Andrade

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terça-feira, 15 de novembro de 2011

Dileção

O poeta
é a seta
que aponta pro peito.



Ígor Andrade

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Ah se ela entendesse minha poesia...

Difícil demais
esse caminhar...
Esse caminhar
sem pernas.

Uma hora vai.

Outra hora "você" vem.

Não consigo mais
pensar direito.
E tenho o direito
de dizer que
ainda penso.

Minha dor
é saber
que sou tua dor.

Antes amor.
Agora amor.
Ainda amor?

Alguém escorregou
em algum verso
não escrito.

Difícil demais
esse escrever
sem tuas mãos
qualquer leitura
sem teus olhos.

Não ando muito bem
sem seus pés.

Assumo:
Perdi o passo
o traço
o rumo.
Estou ficando doente
sem sua saúde.



Ígor Andrade

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segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Foi sonho?

Não ando dormindo bem.
Não ando dormindo.
Não ando.



Ígor Andrade

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domingo, 13 de novembro de 2011

Bobeada

Repito pra mim mesmo:
Ando mesmo
me repetindo.



Ígor Andrade

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Agudo cósmico que ninguém liga

Crio poesia
do nada
pro tudo.



Ígor Andrade

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Confusão

O bêbado na esquina
deitado no chão
falando sozinho.

A criança no beco
cheirando cola.

O perfume da adolescente
e sua falta de preocupação
com a vida.

Depois disso
a rua vazia.

Sol ameno
e minha respiração.

O passado.

Isso é tudo que vejo.

Sou o bêbado
a esquina
e a palavra ao vento.

Sou a criança
e a cola.

Sou o perfume
a adolescente
e a falta de preocupação.

Sou a vida
o depois disso
e a rua vazia.

Sou o passado
mas não passo.

Domingos...



Ígor Andrade

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sábado, 12 de novembro de 2011

Metonimia de hoje

Insisto no óbvio
porque sou burro.
Fosse inteligente
insistiria no que não existe.

Insistir no transitivo do verbo
é permanecer na ignorância
do sujeito.

(Nem eu entendo o que escrevo
às vezes...)

Insisto porque existo.
Eis o paradoxo
da desgraça toda.

A insistência há muito
deixou de ser
uma ciência inexata
para ser
o que de certo não é.

Insisto na poesia
todo sábado à tarde
porque me falta um nexo qualquer.



Ígor Andrade

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sexta-feira, 11 de novembro de 2011

O encontro do blog com Esparta

Tenho
300 seguidores
e nenhum me segue.



Ígor Andrade

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quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Poemamento

Todo lento
tudo tento
pouco vento
calor.

Me enfrento
não me aguento
movimento
amor.



Ígor Andrade

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terça-feira, 8 de novembro de 2011

Assumo

Tudo que escrevo
é pra ela.
Seja ela quem for.



Ígor Andrade

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Acédia

O tédio.
O prédio.
O médio.
O eu.

Tudo eu.

Silêncio armado feito concreto de cara pro céu.

É extremamente desgastante
passar a tarde
querendo a noite
enquanto o dia não passa.

Tudo que consegui neste dia
que não acabou
mas parece perdido
foi um pedido
de paz
do espelho.

Vermelho
era o batom daquela mulher
que nunca beijei.
Geniosa feito o raio.
Branca feito um copo de leite.

Enfeite natalino sem serventia.

Enquanto a terça não acaba
eu já imagino a quarta
a quinta, a sexta...

Minha vida é domingo
e me agarro em lembrança boa.

O tempo voa
e eu aqui
sem pernas...



Ígor Andrade

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domingo, 6 de novembro de 2011

Meio

Todo princípio
inaugura
a hora final.



Ígor Andrade

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Ninguém

Ninguém entende
o domingo
e nem eu.



Ígor Andrade

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Meio Bukowski

Sinto o cheiro de sexo
em cada linha
de cada poema
que ainda não escrevi
dentro daquela mulher.

Verbos brutos de quem sabe amar.

Um entra e sai
dos diabos
no céu.

(Hoje eu quero o inferno
com ela.)

Eu sinto o calor
de um vulcão
irrompendo
as eras.

A gente era
tudo o que eu tinha...



Ígor Andrade

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Domingos

Não sei quem sou
e nem quem fui.
(Quem serei muito menos me interessa...)

Hoje
sem prazo
prece ou pressa
caminho pelas calçadas do domingo que parece o de sempre.

Inauguro cada hora
com o sorriso finado
que lembro dela.

Poderia chorar copiosamente
mais uma vez
olhando pra foto
meio laranja
daquela mulher
toda maquiada -
coisa de fêmea vaidosa
mas hoje prefiro gargalhar
como fazíamos quando o mundo
queria desabar.

Carrego nas mãos
um espírito de peregrino
que não chega nunca.

Passos que não cansam.

Topada nenhuma me pára.
Tapada nenhuma me fala:

"O mundo é dos poetas!"

Ando por aí meio sem pernas
sob um sol agradável
tirando o mofo da alma.

Cães imaginários
me seguem até o portão
de casa.



Ígor Andrade

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sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Poema moderno

Ganhei um beijo
no ombro machucado.

Mandei um beijo
no olho sem rímel.

O sonho era:
Mensagens no celular.



Ígor Andrade

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quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Zombaria

Engraçada é toda
verdade
que ninguém quer saber.



Ígor Andrade

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A queda

Estou além de mim
e não posso fazer nada.
Chego antes dos meus passos
e sinto medo da escada.

(Antes que eu me perca no poema
devo dizer que amo uma desgraçada.

Antes que eu me encontre na vida
devo calar meu ponto final.)



Ígor Andrade

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Um poema bobo pra ela (in utero)

Tudo que há em ti
há também em mim.

Grande coisa!

Hoje procuro outra coisa.

Um algo qualquer
que a preguiça não vença.

Sinto fome
mas também sinto vergonha
da minha vazia despensa.



Ígor Andrade

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Inútil(idade)

A utilidade
inutiliza o homem.
Cuidado com isso!

Não me sinto útil
ultimamente.

Eu
último minto
no íntimo
manto.

Eu não me espanto
nem espano mais
móvel velho que não me serve.

Hoje qualquer pranto
seca em qualquer olho
que não é meu.

Cuidado com isso!
A utilidade
inutiliza o homem.



Ígor Andrade

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Degraus

Você nunca sabe.
Você nunca sobe.
Você nunca soube.



Ígor Andrade

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domingo, 30 de outubro de 2011

Antes que o domingo acabe

Para o amigo-irmão Victor Ramos.

Antes que o domingo acabe
reconheço um amigo
na vida que nunca tive.

Não é a raiva pela humanidade
nem o silêncio que se faz
nas horas mais longas
que me desanima tanto.

Me desanima não ter outros amigos como você.

Prontos para matar e morrer
seguimos nessa vida
como os combatentes na guerra.

O lado forte em qualquer batalha
sempre será a irmandade.

O velho te saúda
antes que o domingo acabe.

(O amigo de verdade é uma ave
que não tem medo de céu algum.)



Ígor Andrade

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Desejos

Pinto o domingo
como quem pinga
dormindo.



Ígor Andrade

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Domingo 05:25

Há muito que procuro o significado de ser
sendo eu mesmo o único poema em que me escrevo.

Ruas vazias ao amanhecer
enquanto o tempo passa
e eu despercebido
na ausência do silêncio
aqui dentro.

Nunca encontrei ressonância alguma
no cheiro de terra molhada
e nessa espera do calor subir.

Às vezes me vejo como uma calçada
cinza e com fendas que vão daqui ao Japão.
Procuro pés que pisem em mim com cuidado
suave como o caminhar de um rinoceronte...

O mormaço da alma
de certo é a perda de memória.
Incomoda os imbecis.

Muitos por aí falam de dor
mas não a carregam como eu.
Muitos bebem, fazem sexo ou se masturbam
e esquecem que vão morrer.
A morte é uma constante absurda
na minha fatídica existência.

(Pelo menos eu existo
ou logo penso...
Vai saber!)

Muitos por aí
vivem por acolá
enquanto eu
procuro meu aqui.

Acho que o sentido de qualquer vida
é esgotar os horizontes
tomando café
e lembrando da noite
que não tivemos.

A vida deve ser apenas um domingo
em que vou dormir sem hora pra acordar.



Ígor Andrade

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sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Entreouvir

Inferno
ou inverno.
Sou sempre interno.



Ígor Andrade

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Escrevo

Escrevo sozinho na noite.
Escrevo na noite sozinho.
Escrevo sozinho pra noite.
Escrevo pra noite sozinho.
Escrevo noite.
Escrevo sozinho.
Escrevo sobre o que é ser sozinho
e escrevo sobre o que é ser noite.
Escrevo
porque não tenho
nem a noite
nem a solidão.
Escrevo.
O que escrevo?
Eu apenas escrevo...



Ígor Andrade

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terça-feira, 25 de outubro de 2011

Dilui (ou de lua)

Sou o que
de melhor
nunca fui.



Ígor Andrade

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sábado, 22 de outubro de 2011

Dies Saturni

Levanto e saio.
Não, calma, não saio
ainda.

O poema é longo
eu que acordei meio curto.

Sento na cama
com olhos apertados
sem meus óculos.
Leio Bukowski
depois Lennon
tentando acordar.

(Faz tempo que não bebo...)

Uma xícara de café
e preciso sair.

Não, eu não preciso sair
mas quero
talvez precise
eu vou.

Escovo os dentes
com pasta e sangue.
O dia começou.

Dia quente por sinal
e barulhento.
Bato a porta de casa
e as buzinas batem meu juízo.

Uma mulher com uma camisa que mais parecia a bandeira do Vietnã do Sul
quase foi atropelada na minha frente.
(A mim não faria falta!)
Deve ter sido culpa da bandeira.

À caminho da academia
cultivando ódio
logo de manhã cedinho.
É assim que homens imbecis agem...

Eu preciso voltar a treinar boxe.
Socar os caras pensando em alguma ex-namorada
ou em algum amigo traidor.
Sim, o pacifismo foi passear
no inferno.
Me deixem dizer o que penso!

(Eu preciso de inimigos
de mais inimigos
além de mim mesmo.)

Que dia quente!
Minha barba está muito grande!
Essa academia é um forno!

Levanto todos os pesos que posso e não me satisfaço.

Braços fortes
panturilhas fortes
abdômen forte
coração fraco
fraco fraco.

Chega de treino por hoje.
Sinto fome.
Quero voltar pra casa
pra escrever.

Eu preciso de um nome novo
para o silêncio que eu não faço.

Volto no calor absurdo
para almoçar um frango grelhado
e não sei quem o matou.



Ígor Andrade

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quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Meio quinta-feira

Numa tarde chuvosa
com meu espírito nublado
pratico a paciência
com semelhantes que não
se parecem comigo.

Numa tarde como esta
não enxergo perigo
muito menos a luxúria
mas sinto pena
de nós
que não somos a tarde.



Ígor Andrade

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terça-feira, 18 de outubro de 2011

Caráter

O sábio ama
o que ele pensa
não ter.



Ígor Andrade

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Itinerário

O passo seguinte
é o próximo...
passo.



Ígor Andrade

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domingo, 16 de outubro de 2011

Dies solis

E este domingo nublado
que mal passou
e nem passa?

Um homem parado
na janela
disfarça
a vida.

Domingo é isso:
falta de compromisso.

Dia bobo de missa.
O povo pede
pra qualquer deus:
preguiça.

Coragem mesmo pra pensar
só poucos têm...

As aventuras de Robson Crusoé
enfrentando o ócio de Matusalém.

Hoje só a palavra do náufrago me interessa.
Não tenho calma
nem tampouco pressa.

O retrocesso da raça...

Cadê minha compressa?

Meu ombro dói.

E tudo neste domingo foi
cinza
como os corpos carbonizados em Pompéia.

(Vesúvio veste-se de carrasco
e acaba com a graça dos sorrisos levianos.)

Levei décadas para perceber
que domingo é o melhor dia
pelo menos pra mim.

Como um leão banido do bando
procuro sombra e comida
agora sozinho
e não reclamo.

E todo mundo segue seguindo.
É a vida.

Há uma semana atrás
uma data pra se pensar:
dia nove de outubro.
Dia em que nasceu Lennon
e morreu Guevara.
Mas deixa pra lá.
Ninguém sabe do que estou falando.

Viver no desatino da palavra
é o que quero.
E eu só espero
o próximo verso.

Diante de todo absurdo
este domingo está em mim.



Ígor Andrade

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