sábado, 25 de agosto de 2012

Cevando


Sempre que bebo
sinto ainda
mais sede
e acho que sei escrever.

Converso com a janela
e sinto muito.
Olho pra minha cama gigante
e sonho pouco.

A rua sou eu.
Mudo.

Louco é quem não nasceu hoje.


Ígor Andrade

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quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Poema viagem


O trem de hoje passa calado
e vazio.
Carrego comigo o frio
dos meus avós que vieram do interior do Ceará.
("O que será que será"
que eu quis dizer?)
Escrevo brisas sinceras.
As eras não alteram o romantismo.
Este poema há de ser uma cruz
ou um alívio
ou um dilúvio.
Saudade da infância que me sofre.
O tempo: uma ilusão.
O cosmos devora qualquer dúvida, qualquer dívida e qualquer dádiva.
Fui comer sem fome e cuspi aflição.
Afeição
e isolamento.
Lamento não ter mais idade.
Ninguém me entende
nem eu.
Nasci agora.
Não me acostumo com gravatas
e meu repouso maior talvez seja o cansaço físico.
Tenho sido a vergonha da família.
Não estudei direito, medicina ou arquitetura.
Literatura é útero.
O pensamento é estômago.
Estou magro.
E quero beber cerveja.
Que assim seja um bom desabafo.


Ígor Andrade

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sábado, 18 de agosto de 2012

Bordel Bordado


A Lígia Cargnelutti me convidou e eu aceitei. Hoje escrevi aqui.


Ígor Andrade

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Continuamente


Note:
A noite
nada
em tudo.


Ígor Andrade

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sábado, 11 de agosto de 2012

Corredor


Entre os rostos de agosto
conheci um fantasma.
Asma de poeta
é camisa de força.
Ouça a madrugada
e seu assalto.
Asfalto divino intocável.
Sou o sujeito mais sozinho do mundo.
Ou devo ser burro demais
para entender a vida.
A vida não se entende.
A vida não se estende
por qualquer saudade.
Meu ventilador parou.
Meu juízo quebrou a bengala do aleijado.
Um soco de Muhammad Ali, por favor.
Preciso dormir
só por hoje.
O agora se embriagou.


Ígor Andrade

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Arremesso


O que há de mais indigesto?
O gesto
de quem não se conhece.
A parede esquece
de mim.
O fim é o começo
depois de doze cervejas.
Berço de palavras...
Desapareceu a testa.
A festa
dentro do quarto
escuro
e sozinho.
Ninho de asas!
Duas mãos.
Dois olhos.
Sem pernas.
Cem pernas
para alcançar o inalcançável.
Hoje não quero visita.
Acho que nunca quis.
Eu fiz
de mim
uma fortaleza sonolenta
que esquece do fígado
mas lembra do bolso vazio.


Ígor Andrade

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sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Uma hora


Lá fora o tempo. 
Aqui dentro o tempo.
Provocante, o tempo
descobre o ignorante
mas ajuda o irracional.
O tempo faz mal.
O tempo faz bem.
O tempo é amigo de quem?
No meio do tempo
havia outro tempo
sem tempo pra temporal.
Lá fora e aqui dentro
é tempo de ser animal
e ter taquicardia.


Ígor Andrade

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Pilão


Um começar de sombras.
O eco da minha mesa.
O café pra enganar a fome.
Não existe ansiedade de amanhãs.
Converso com uma folha em branco
assim como converso com minha pequena cadela.
(Era uma deusa, ela?)
Rafaela... dorme e sonha.
Feliz de quem sabe amar
o que escreve.
Odiar um poema é entender
qualquer coisa.
Não há barulho de carros na rua.
A vida é crua.
Tudo é mortal demais:
madrugada.


Ígor Andrade

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sábado, 4 de agosto de 2012

Bohemia



Não é o que é.
Nem o que eu vejo.
Madrugada
este lampejo
além de qualquer ser.


Silêncio em que se perde
o que não se ganha.
Aranha que faz teia
na rua vazia.


Eu fazia antes
o que faço hoje
mas não sabia:
penso como ninguém.


Além daqui
consciência que não se apaga
e não se afaga
além de mim.


Que a boemia me perdoe
porque eu preciso dela.


Aquarela quer amanhecer
antes dos olhos.




Ígor Andrade

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quarta-feira, 1 de agosto de 2012

O cão em mim


Os primeiros passos de um bocejo atrevido vêm com o silêncio branco de um quarto escuro. Antes de dormir, duas cervejas e uma lembrança: meu cão morreu. Parece que estou parado numa dor que dói mais quando todo mundo dorme. Estou sozinho olhando fotos de quando meu pequeno companheiro era filhote. Preciso mudar de juízo. Crescer ainda que sinta o decréscimo. O último osso foi ótimo, enquanto o átimo é boca seca. Átomo que se vai... Mudo de posição para sonhar maior. Quando sonho menor, tenho pesadelos; acordo assombrado e com fome. Levanto pra comer algo doce e me arrependo depois. Meu cão tinha doze anos e eu tenho trinta e um. Atravesso a madrugada como se tudo fosse olho. Me enxergo nas quietudes. Muito embora a escrita me acelere. Quero correr, quero pular, quero morrer. E quero morar na praia. A cidade me mata. Minha família precisa de mim, vivo. Vivo, em alguma vida, alheia. Sinto falta do meu animal. Coisa feia é esconder saudade. Ele era mais do que Jesus, pra mim. E o maior pecado é a distância. A morte separa pra sempre. Tudo vira pó(esia). A cruz de hoje é o prato cru do empanturrado. Fastio e mãos suadas. Transpira minha caneta velha. Sou um velho antes da velhice. (Quem me ensinou a escrever?) Cuido do verso para ele me educar. (Cadê Deus?) Em algum momento desta noite devo me sentir um sujeito melhor. Evolucionista mesmo é o sono.


Ígor Andrade

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