domingo, 31 de outubro de 2010

Dil(e)ma (um poema desnecessário)

O país em vermelho
se prepara
para o próximo passo:

O abismo
o retrocesso
o escapismo
o descompasso.

Qualquer um eleito
seria o mesmo
daria no mesmo.
Tudo farinha do mesmo saco
é a minha impressão.

Como a maioria dos brasileiros
tenho o direito desde já
de não acreditar em mais ninguém.

Tenho direito de ser extremista
pelo menos em meus poemas
(sem sentido).

Não acredito na democracia
e nunca acreditei, aliás.

Eu penso que
escrever sobre a democracia
seria um poema impossível.


Ígor Andrade

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Celso

Eu não te conheço
e nunca te vi
mas me disseram
que você é um sujeito bom
um sujeito bom
de jeito calmo
um sujeito bom
tranquilo como o céu
deste fim de tarde
(Céuso).

Não sei porque este poema é seu
mas hoje me deu
uma vontade de ser Celso também
(carregar uma dor que não é minha
faz o entendimento do poema).
Uma vontade
de ter família
de ter cachorro
de ser médico
de ter graça.

De cuidar dos outros e esquecer de si.
De ver graça no sorriso alheio.
(Você sabe disso!)

É, Celso...
a graça da vida
não está na cura
está na superação.

Super ação
é acordar todo dia
querendo viver
querendo ver
a mulher sorrindo
os filhos crescendo
e no silêncio interior
perceber nosso eu
o eu grande
satisfeito com tudo agora
sem esperar o amanhã.

O amanhã
é a manhã
de sempre
de nascimento.

O amanhã é
e tem de ser
agora.

Celso, eu não te conheço
e nunca te vi
mas me disseram
que você é um sujeito bom
um sujeito bom.



Ígor Andrade

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sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Um poema enjoado

Pingo no olho
colírios que me azedam a garganta
(desconfio que eu já estava azedo
antes mesmo de confiar nos colírios).
Espero o dia passar
sem ver o dia passar direito.
Vejo tudo branco
e não sinto paz.

Eu não sei onde anda minha sensibilidade,
e sinceramente, pouco me importa a cidadania
de hoje ou de domingo.

Na sexta-feira todos se divertem
ou alguns mentem pra si mesmo.
Eu apenas tento me definir
ou definir minhas verdades
sem sucesso.

A sala daqui de casa
está em reforma
e eu me deformo.
Desconstruo minhas paredes
antes de pintar.
No meu projeto só penso em janelas.

Vejo na tevê um pequeno garoto
necessitando de um transplante de medula óssea
há tanto tempo e não consegue.
Leucemia antes de tudo, é um nome feio!
Mudo de canal e vejo um bebê
que foi encontrado na Indonésia
depois de dois dias do tsunami.
Ele está vivo
e seus pais morreram.

Me sinto o sujeito mais egoísta do mundo.
Sinto todo mundo mais egoísta ainda.
Este poema pode parecer egoísta.

Eu não sei quando
tudo isso vai acabar.
Ou quando outra coisa
vai começar.
Eu acho que só sei escrever
sobre mim ou sobre meus dias
porque não espero mais nada
do tempo e do espaço.

Poesia minha de cada dia
dai-me paciência
dai-me sapiência.
Os olhos de dentro
devem enxergar melhor.



Ígor Andrade

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quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Nina

Minha poesia minha
tão minha
minha
que é sua
tão sua
sua
está escondida
em cada descoberta
nossa
tão nossa
nossa
e não é de ninguém.



Ígor Andrade

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terça-feira, 26 de outubro de 2010

Eu mataria

O limite da arte
não é a morte
é a sorte
de fazer arte
e continuar forte
quem sabe vivo.



Ígor Andrade









Auto-retrato matando Bento XVI
(clique no nome e conheça os trabalhos do artista)

obs: Sim, escolhi Ratzinger, o Papa, para representar o meu asco pelo catolicismo.
Escolha o seu alvo também, dentre tantos que ele executou em sua série Inimigos.
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domingo, 24 de outubro de 2010

Quando a saudade é rica, a rima é pobre.

A minha menina dorme
e a madrugada foi embora.

Eu tento me esconder do sol
como quem foge da hora.

E agora
logo agora
eu agora
procuro a escuridão.

Me acostumei a me acostumar
com meus poemas de solidão.



Ígor Andrade

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Incompletude

Não é que me falte
um pedaço.
Me falta um inteiro.



Ígor Andrade

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Saudade

Amanheço
silenciosamente
sem você
sem tevê
sem me ver
no espelho
e eu espero
que o sono
que o sonho
não me anoiteça.



Ígor Andrade

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sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Nublação

Escrevo poemas
sem enxergar o papel.

Escrevo poemas
calados no impossível.

Escrevo poemas
para me acalmar.

Escrevo poemas
e devia descansar.



Ígor Andrade

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Coceira Ocular

A tarde quente
e o sono que não durmo
presente.

A cefaléia do passado.
O suco de manga gelado.
Algo me dói o dente.

Eu me sinto desocupado
e a tarde é quente.
Preciso do ar
que não sei encontrar.

Tudo e qualquer coisa hoje
me incomoda.
Escrever este poema me acomoda.
Eu desejo o que não sei explicar.

O carro barulhento
na rua suja.
O povo barulhento
na rua suja.
O maldito calor.

E eu que seja...
E eu que veja...
E eu que dor...

Tudo está errado.
Eu me sinto errado.
O dia parece errado.
Hoje até o certo é errado.



Ígor Andrade

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quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Da minha nobreza

Me preparo
para uma outra vida
que é a mesma
e não tem preparo.

Gosto de chamar assim
as minhas mudanças
de um novo passo.

Posso
e passo
meu todo inverno
inferno
descalço.

Me preparo
neste silêncio branco
de olhar transparente.

O próximo passo
não fica distante
e é sempre dentro
da mente.



Ígor Andrade

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segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Desierto (releitura)

Quando pequeno
eu parecia ser
tão grande...



Ígor Andrade

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Desierto

Meu pai
me pegou muito pequeno
e me ensinou a nadar
da seguinte forma:

Explicou o que eu tinha de fazer
com braços e pernas
e me jogou na piscina.

Hoje eu muito grande
não sei bem o que fazer
com minha cabeça
quando sou jogado no mar.



Ígor Andrade

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sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Minha menina

Tarde de saudade grande
de olhar perdido
no seio falante.

Tarde de pensar
na inocência
que me engana
sempre.

Tarde em que o vento fala
e a menor escala
é incomensurável.

Tarde que mente
e isso provavelmente
é o brilho do improvável.

Tarde para lembrar
daquele pôr do sol
por ser seu.

Tarde que me sinto
sem ela
um ser pequeno.



Ígor Andrade

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quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Noche

Noites assim
noites aqui
noites sem graça
noites devassas
noites de valsas
e sons antigos.

Um tempo
antigo
agora.

Estou tão parado
que não vejo perigo
em me conquistar.

Este quarto
esta casa
tudo sou eu.
O que quero?

Sou uma coisa
que não sente.
É isso.

Esta noite
eu quero mentir.
Não é isso.

Noite que
me esgarça a alma
me tira o juízo
me faz noite.

Em mim
toda a escuridão
necessária.



Ígor Andrade

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segunda-feira, 11 de outubro de 2010

A mente que mente, sente.

Para o amigo Fabio Rocha.

O poeta
não escreve
sobre temas.

O poeta
escreve
sob teimas.



Ígor Andrade

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Da saudade descoberta

Ando sentindo falta
de quando era criança
e pensava ser adulto.

E fazia tempo
que não sentia isso...

Tudo era tão grandioso.
Eu era tão grandioso
mesmo pequeno.

Todo amor que tinha
e não sabia como usar
(Julgo não saber usá-lo,
até hoje!)
era imaginário demais
e me bastava.

Hoje nada me basta.
Nada me basta.
Basta.

Estou desempregado
porque quero.
A mulher que eu amo
está longe
mesmo perto
(e isso eu não quero).
Estou com fome
do que não sei cozinhar.

Preciso da casa antiga
de muro azul
e do céu que era
da cor que eu quisesse.

Antes eu conseguia sorrir
sem querer.
Tornei-me poeta desde então.

Não mais construo castelos
no quintal do meu avô
e isso me desanima.

Eu pegava limão no pé
fazia limonada
mas não bebia limonada.
Eu bebia a experiência
da vida maternal de Dona Augusta.

Já não bebo mais
a experimentação
da cozinha da vovó.

Sinto a sede
do filho que terei.

Onde cabe tanta coisa
aqui dentro
que eu não sei controlar
muito menos sei pra que serve
aqui fora?



Ígor Andrade

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domingo, 10 de outubro de 2010

O eu grande silencioso

Eu sou
um piano velho
grande
empoeirado
de teclas sujas
largado
há anos
na sala branca
e vazia.

Eu sou
de um peso absurdo
e poucos no mundo
tiram melodia
de mim.



Ígor Andrade

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Banal reality

Quanto mais assisto
reality show
mais me identifico
comigo mesmo.

Assisto a fazenda
e não faço nada.

Dominguinho perdido
e eu sem me encontrar.



Ígor Andrade

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sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Epigrama nº1

Só conheço o que não vejo
sinto saudade do que não toco
me perco em qualquer desejo
mas me encontro e me sufoco.



Ígor Andrade

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Sócrates

Um velhinho caminha na rua
tão devagar
mas tão devagar
que me sinto quase parando.

Olho pra dentro
uma memória nua
e percorro um caminho imenso.

Eu aqui
na varanda do quarto andar.
Tudo passa a ser
tão devagar.

Cada folha balança lenta.
O vento é fome.
Me vejo na preguiça dos cachorros.
Ouço minha respiração
e depois um silêncio absurdo.

Um velhinho caminha na rua
tão devagar
mas tão devagar
e vejo minha vida
passar tão rápido.



Ígor Andrade

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quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Seja qual for

A tarde tarda
no todo
que é cedo.



Ígor Andrade

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quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Falta-me inspiração

Cada minuto
longe dela
parece cansaço
vida amarela.

Amar ela
em cada minuto
amar a fruta
pensar no fruto.

Preciso do sono
de antes agora
sou cão sem dono
em pálida hora.



Ígor Andrade

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Manhoso

Eu existo
só.
Só existo
teimoso.



Ígor Andrade

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terça-feira, 5 de outubro de 2010

Flores y la esencia del ángel

Diante de mim
o dia cresce
mas todo mundo esquece
que diminuir é preciso.

Às vezes
recolher o mais íntimo da gente
é mergulhar
num caos necessário.



Ígor Andrade


Flores y la esencia del ángel.
Juan Carlos Estrela

Contraposição

Ainda procuro
o que procurar-
a palavra encontro.



Ígor Andrade

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Às cegas

Procuro
feito louco
uma palavra
que me salve
nesta noite
mas
nem a noite
eu encontro.



Ígor Andrade

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domingo, 3 de outubro de 2010

Silva

O partido verde
também me parece
um partido negro.



Ígor Andrade

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Da preguiça do voto

Crio coragem
para sair e votar.

Crio coragem
para sair e voltar.

Crio coragem.

Votar é preciso.
Voltar é conciso.
Eu consigo
criar coragem.


Ígor Andrade

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O chão da sala

Um poema de segunda (20/09/2010).

Na falta do que fazer
(e assumo minha cara-de-pau
de desinteressado político
neste pós-operatório)
assisto o horário eleitoral
entediado
envergonhado
esquecido.

Ninguém me convence.
Ninguém fala nada do que quero ouvir.
Ninguém parece verdade.
(Nem eu.)

Fico lembrando de um amigo
que vibra
defendendo uma bandeira
uma política utópica
um lado
um candidato
um partido
(interesses ocultos
partidos no imaginário).

A impressão que tenho
é que os poucos que discutem política
nada entendem sobre o ser humano.
Mas sou um pobre ignorante
e nada posso falar
(e penso poder escrever).

Há muito
a política
deixou de ser o que é
(Será que ela já foi?)
deixou de ser
o que deveria ser
(Será que ela deveria?).

A política
assim como este poema
tem muitos parênteses.

Governar é uma ciência
que só os nobres homens
de caráter transparente
deveriam executar.

O povo
é executado diariamente
nesta ignorância infinda.

Assisto o horário eleitoral
entediado
envergonhado
esquecido
e não vejo nada
em que eu acredite.
Nada!

Sou um poeta
e tenho como função
(quando quero)
antes de tudo
deformar as visões de quem me lê
desconstruir as idéias crescidas
descrever o indescritível.

Mas os políticos
ou os candidatos
não têm função alguma.
E isso parece errado
pelo menos pra mim.



Ígor Andrade

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sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Pentacam

Nunca usei tanto
minha teoria
do passo de cada vez
tão ao pé da letra.

Mãos!
Caminho com minhas mãos
mesmo sem enxergar.

Quanta dificuldade é ver
sem ver.
Quantas pessoas não valorizam
o belo
e não aprendem a contemplar.
O medo de tropeçar
de cair sem cair.
Sei lá!

Tento enxergar
as faces das pessoas
e nada
e nado
na imaginação sem luz.

Meu irmão me conduz
ele é meu entrever
minha visão
meu ser
sem ser...

Corredores que
não vejo o fim.
Elevadores que
mesmo cheios
me parecem vazios.
Paredes brancas
e geladas
geladas
e brancas.

Dor de cabeça, por favor
agora não!
Este tatear já me basta.

Aperto meus olhos
e meu peito aperta
meu estado de alerta
só vai embora quando
eu voltar pra casa.



Ígor Andrade

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