segunda-feira, 28 de novembro de 2011

(Des)esperança

Para o meu irmão Thiago Andrade.

O desencontro é um encontro
com a distância.

Não se chega a lugar algum
quando o lugar algum
parece mais próximo
do que o desejo real de busca.

Desespero
mas espero
algo novo.

O velho se cansa
e de tão velho me cansa.

Descansa
em mim
alguns sonhos
que ainda não tive.

Me prometo a reconciliação irreconhecível
diante da incomensurável ausência de paz.
Te prometo tudo
que eu puder mais.

Sou capaz
de mover o mundo -
o meu e nosso mundo
com a palavra certa
na hora errada.

Desesperança mesmo
é quando ignoro o desamor.

Os frutos verdadeiros nascem
sob o adubo do sangue do irmão;
este outro ser que também sou
e não me abandona.



Ígor Andrade

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domingo, 27 de novembro de 2011

Declaro quatro amores

Declaro quatro amores:

Um já enterrado na casa perto da praia.
Onde a brisa fria alisa o túmulo.
Cúmulo da saudade embaixo da terra.

(Hoje deveria chover...)

Outro amor eu guardo no peito.
Aquele silêncio do predicado antes do sujeito.
Norma clara do padrão escuro feito pra confundir.
Obra-prima-filha-e-mãe do tempo.

(Lembrança é calor!)

Um terceiro amor ainda não nasceu
mas já o declaro por pura agonia.
Me afobo quando amo -
qualquer coisa que seja antes do nascimento
e sobretudo reclamo
todo o vazio que é solidão.

(Domingo é um berço estranho.)

O último amor
eu chamo de primeiro
que pode ser segundo ou terceiro
e veio antes de mim.
Fantasma, vício ou virtude...
Amplitude máxima dessa existência
que é uma insistência no ódio.

Silêncio...
Declarar é o ópio imbecil do pobre sentimental.

(Antes da noite
nesta tarde miserável
uma cadela prenha
uiva as penúrias da teimosia da raça.)

Declaro amores pro invisível
e antes de qualquer questionamento
declaro que não amar deve ser melhor.



Ígor Andrade

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quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Desde que amanheceu

Desde que amanheceu
eu já era noite.

Notei isso hoje.
Sempre me atraso
em minhas conclusões.

Toda a beleza da minha ignorância
é suplantada na minha falta de compromisso
com a vida.

Amanheceu já há meio dia
e eu ainda não acordei.
Meio que via
tudo se perdendo
como sempre.
Meio que lia
Neruda
de cara pra janela.

A rua hoje está medonha
de tão silenciosa.

Os poemas buzinam
pro meu juízo andar.
Escuto o semáforo
que me pede atenção.

Sou aquela exatidão de dúvidas.

Desde que amanheceu
eu sou saudade.
É isso!



Ígor Andrade

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domingo, 20 de novembro de 2011

Alprazolam

Apraz
o foz
a paz
o pós
sem nós
que jaz
no jazz
sem blues
nem voz.



Ígor Andrade

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Quatro horas da manhã

Quatro horas da manhã.
Não consigo dormir.
Não consigo dormir.
Não consigo.

Meu peito carrega uma manada galopando desgovernada pro sul.

Apolo sem colo treme no solo da solidão...

O pânico é o irmão
e é também a cara
do antes de amanhecer.

Engasgo com um poema com gosto de sal.
Estou mal
mas passa.

Devassa devassa devassa
madrugada.

Não consigo dormir.
E não consigo esquecer.
Eu me sinto abandonado.
(Mas por quem?)
E sei que é triste aceitar isso.

Não consigo dormir.
E sinto saudade de quem nem conheci direito.

Meu peito.
Meu peito
meu.

Algo se perdeu
em alguma filosofia
de quem se acha.

Nada agora se encaixa
na metafísica desse silêncio.

A borboleta que bate asas em Tóquio
e toda a loucura da teoria do caos.

O cão
chorando no quintal do vizinho.

Escrevo sozinho.
Escrevo sozinho.
Escrevo sozinho.

O canto adiantado do primeiro passarinho.

Eu não entendo mais nada.
Eu nunca entendi nada.
Eu.

Algo se perdeu
em mim
e parecia nós
e parecia um laço.

Disfarço dor com verso
e sem cor o verbo
conjuga todo tempo errado.

Não entendo de palíndromo
e não consigo dormir.



Ígor Andrade

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sábado, 19 de novembro de 2011

Madre

Para minha preciosa mãe Rejane Maria e minha querida tia Regina.

Passei algumas horas
tentando encontrar as horas
e as palavras certas
para tentar explicar
o amor de um filho.

Não consegui
e nunca conseguirei.

O amor nasce com a gente
e depois ganha o silêncio...
O amor reside no útero
mesmo depois de vazio.

Sempre seremos semente
que não cresce direito
sem os cuidados da mãe.

Sempre seremos outra coisa
que vocês não imaginam.

(Me tornei poeta só pra dizer que amo de uma forma diferente...
Acho que é isso!)

Acho
de qualquer forma
que o verbo ser
é a forma mais pura
de dizer que fomos
e somos
ainda de vocês.

Um passeio sobre as palavras
e eu passo a entender
toda a importância da gravidez.

Eu passo e passei horas...

Passar horas
aliás
pensando na beleza da maternidade
causa frio,
aponta estudo.
Isto tudo
sou eu no mundo
tentando acreditar que mudo
e que nunca vou te perder, minha mãe.

A mãe deu a luz.
A mãe é a luz
de qualquer túnel sem fim.

Passei algumas horas
tentando encontrar as horas
de uma poesia parida
em meio as lágrimas.

Tudo que vejo
é o umbigo que nos ligou
em cada medida de tempo.

Tempo
tento
e eu lamento
não saber falar bonito
nem poder te dar tudo.

O nada é a única coisa
que posso prometer
antes de qualquer poema.

Antes, bem antes
ou depois desse agora
me vejo analfabeto.

Uma mãe que parece casa
encontra um poema que parece teto.

Antes feto
depois fato
nasce o tato
cresce amor.

Mais ou menos isso
que quero dizer
mas nem eu entendo.



Ígor Andrade

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quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Sala vazia

Na ponta dos pés
se fazem
os ouvidos.



Ígor Andrade

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Perto do Natal

Corro no fim da tarde
e corro além da tarde.

O fim é o fim
ou é o começo
de sei lá o quê.

Cansei as pernas
mas fortaleci a mente.
(Ou foi ao contrário.)

Atenção!

O crepúsculo também mente.
E eu pareço humano demais
quando escrevo sobre meu dia.

As crianças brincam na praça reformada
e os casais idosos caminham de mãos dadas.
Os pássaros desta praça desistiram de voar;
caminham despreocupadamente.

Troco minha poesia pelas asas enferrujadas.

Eu me deformo
nos poemas que se formam
em cada olhar perdido
alheio.

Por que corro sozinho no fim da tarde?

Eu não queria
mas às vezes sinto pena de minha solidão.

Paro na banquinha de sempre
e fico pechinchando livros clássicos de filosofia.
As livrarias também mentem
assim como o crepúsculo.

Por que anoitece em mim antes de escrever um poema desse?

Eu corro no fim da tarde.
Eu morro no fim da tarde.
Eu sou
um fim de tarde.

Escureço em mim mesmo
buscando um sol...

Perdi metade do dia
tentando evitar o sal
da comida sem gosto da secretária lá de casa.

Estou com fome
de qualquer coisa.
Qualquer coisa chega no fim
da tarde.

E sempre tenho a impressão
de que escrevo bobagens
de cara pro céu.



Ígor Andrade

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terça-feira, 15 de novembro de 2011

Dileção

O poeta
é a seta
que aponta pro peito.



Ígor Andrade

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Ah se ela entendesse minha poesia...

Difícil demais
esse caminhar...
Esse caminhar
sem pernas.

Uma hora vai.

Outra hora "você" vem.

Não consigo mais
pensar direito.
E tenho o direito
de dizer que
ainda penso.

Minha dor
é saber
que sou tua dor.

Antes amor.
Agora amor.
Ainda amor?

Alguém escorregou
em algum verso
não escrito.

Difícil demais
esse escrever
sem tuas mãos
qualquer leitura
sem teus olhos.

Não ando muito bem
sem seus pés.

Assumo:
Perdi o passo
o traço
o rumo.
Estou ficando doente
sem sua saúde.



Ígor Andrade

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segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Foi sonho?

Não ando dormindo bem.
Não ando dormindo.
Não ando.



Ígor Andrade

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domingo, 13 de novembro de 2011

Bobeada

Repito pra mim mesmo:
Ando mesmo
me repetindo.



Ígor Andrade

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Agudo cósmico que ninguém liga

Crio poesia
do nada
pro tudo.



Ígor Andrade

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Confusão

O bêbado na esquina
deitado no chão
falando sozinho.

A criança no beco
cheirando cola.

O perfume da adolescente
e sua falta de preocupação
com a vida.

Depois disso
a rua vazia.

Sol ameno
e minha respiração.

O passado.

Isso é tudo que vejo.

Sou o bêbado
a esquina
e a palavra ao vento.

Sou a criança
e a cola.

Sou o perfume
a adolescente
e a falta de preocupação.

Sou a vida
o depois disso
e a rua vazia.

Sou o passado
mas não passo.

Domingos...



Ígor Andrade

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sábado, 12 de novembro de 2011

Metonimia de hoje

Insisto no óbvio
porque sou burro.
Fosse inteligente
insistiria no que não existe.

Insistir no transitivo do verbo
é permanecer na ignorância
do sujeito.

(Nem eu entendo o que escrevo
às vezes...)

Insisto porque existo.
Eis o paradoxo
da desgraça toda.

A insistência há muito
deixou de ser
uma ciência inexata
para ser
o que de certo não é.

Insisto na poesia
todo sábado à tarde
porque me falta um nexo qualquer.



Ígor Andrade

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sexta-feira, 11 de novembro de 2011

O encontro do blog com Esparta

Tenho
300 seguidores
e nenhum me segue.



Ígor Andrade

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quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Poemamento

Todo lento
tudo tento
pouco vento
calor.

Me enfrento
não me aguento
movimento
amor.



Ígor Andrade

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terça-feira, 8 de novembro de 2011

Assumo

Tudo que escrevo
é pra ela.
Seja ela quem for.



Ígor Andrade

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Acédia

O tédio.
O prédio.
O médio.
O eu.

Tudo eu.

Silêncio armado feito concreto de cara pro céu.

É extremamente desgastante
passar a tarde
querendo a noite
enquanto o dia não passa.

Tudo que consegui neste dia
que não acabou
mas parece perdido
foi um pedido
de paz
do espelho.

Vermelho
era o batom daquela mulher
que nunca beijei.
Geniosa feito o raio.
Branca feito um copo de leite.

Enfeite natalino sem serventia.

Enquanto a terça não acaba
eu já imagino a quarta
a quinta, a sexta...

Minha vida é domingo
e me agarro em lembrança boa.

O tempo voa
e eu aqui
sem pernas...



Ígor Andrade

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domingo, 6 de novembro de 2011

Meio

Todo princípio
inaugura
a hora final.



Ígor Andrade

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Ninguém

Ninguém entende
o domingo
e nem eu.



Ígor Andrade

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Meio Bukowski

Sinto o cheiro de sexo
em cada linha
de cada poema
que ainda não escrevi
dentro daquela mulher.

Verbos brutos de quem sabe amar.

Um entra e sai
dos diabos
no céu.

(Hoje eu quero o inferno
com ela.)

Eu sinto o calor
de um vulcão
irrompendo
as eras.

A gente era
tudo o que eu tinha...



Ígor Andrade

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Domingos

Não sei quem sou
e nem quem fui.
(Quem serei muito menos me interessa...)

Hoje
sem prazo
prece ou pressa
caminho pelas calçadas do domingo que parece o de sempre.

Inauguro cada hora
com o sorriso finado
que lembro dela.

Poderia chorar copiosamente
mais uma vez
olhando pra foto
meio laranja
daquela mulher
toda maquiada -
coisa de fêmea vaidosa
mas hoje prefiro gargalhar
como fazíamos quando o mundo
queria desabar.

Carrego nas mãos
um espírito de peregrino
que não chega nunca.

Passos que não cansam.

Topada nenhuma me pára.
Tapada nenhuma me fala:

"O mundo é dos poetas!"

Ando por aí meio sem pernas
sob um sol agradável
tirando o mofo da alma.

Cães imaginários
me seguem até o portão
de casa.



Ígor Andrade

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sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Poema moderno

Ganhei um beijo
no ombro machucado.

Mandei um beijo
no olho sem rímel.

O sonho era:
Mensagens no celular.



Ígor Andrade

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quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Zombaria

Engraçada é toda
verdade
que ninguém quer saber.



Ígor Andrade

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A queda

Estou além de mim
e não posso fazer nada.
Chego antes dos meus passos
e sinto medo da escada.

(Antes que eu me perca no poema
devo dizer que amo uma desgraçada.

Antes que eu me encontre na vida
devo calar meu ponto final.)



Ígor Andrade

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Um poema bobo pra ela (in utero)

Tudo que há em ti
há também em mim.

Grande coisa!

Hoje procuro outra coisa.

Um algo qualquer
que a preguiça não vença.

Sinto fome
mas também sinto vergonha
da minha vazia despensa.



Ígor Andrade

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Inútil(idade)

A utilidade
inutiliza o homem.
Cuidado com isso!

Não me sinto útil
ultimamente.

Eu
último minto
no íntimo
manto.

Eu não me espanto
nem espano mais
móvel velho que não me serve.

Hoje qualquer pranto
seca em qualquer olho
que não é meu.

Cuidado com isso!
A utilidade
inutiliza o homem.



Ígor Andrade

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Degraus

Você nunca sabe.
Você nunca sobe.
Você nunca soube.



Ígor Andrade

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