segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Saara

O domingo ontem
tinha o céu aberto.
O meu peito hoje
tem calor deserto.
O domingo e a hora longe.
A segunda e o agora perto.
Amanhã não será como antes;
qualquer errado se torna certo.



Ígor Andrade

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sábado, 26 de fevereiro de 2011

Logo

O dia está ruim.
O dia está em mim.
O dia é o fim
de tudo que vai começar.

O dia
a noite
e eu.
Precisamos mudar.



Ígor Andrade

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Acédia

Eu queria hoje
me sentir bem
pra variar.

Não sei direito
o que estou fazendo
com minha vida.
Nem sei o que é direito também.

Caminho na vida
com essa tristeza...
(Pode ser que passe.
Pode ser leveza.)

Vai saber...

Vinte e nove anos de vida
estranha e solitária.
Devo estar cansando.

Não ando sorrindo muito
e ando me preocupando pouco.

Estou ficando louco.
Estou ficando louco.
Estou ficando louco.

Onde estão os meus amigos?

Não sou convidado para aniversários ou formaturas, mas também não queria ir; só queria ser convidado.

Que dia triste!
Olho pro mundo
e só busco o que não existe.

Choro
isento de vergonha
ou crime.



Ígor Andrade

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domingo, 20 de fevereiro de 2011

Impressões

Ela me tateia
como quem vê
no escuro.

Ela é a porta
e eu sou o muro.

Ela me tatua
como quem escreve
no olhar.

Ela é pulmão
e eu sou o ar.



Ígor Andrade

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Indulgência

Eu me sentei
agora pouco
na calçada da outra esquina
e pensei pensei pensei
e ainda não sei
direito
no que estava pensando.

(O que eu estava procurando?)

Tudo parece tão sem sentido.
Por mais que eu esteja feliz
ainda sim sou infeliz.

É tudo muito além
de sorrisos e lágrimas.

É tudo muito além
e tão aqui perto...

Sento na calçada suja
e me sinto sujo.

E parece que vai chover.

E parece que vai chover.

E parece que vou me molhar
e meus cães se molharão também.
O passeio acabou, meus amigos.
E o domingo logo acaba.

(Um bêbado do outro lado da rua
tropeça
sem pressa
nas próprias pernas.
Que vida está sendo desperdiçada?
A minha ou a dele?)

O domingo sempre acaba.
O domingo é a vida
numa calçada fria e suja
que passa
e ninguém percebe.



Ígor Andrade

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sábado, 19 de fevereiro de 2011

Para Walt Whitman















Eu sou o esboço
do pouco esforço
de ser humano.

Ser poeta
já é viver além.



Ígor Andrade

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quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Da paciência

Amar é antes
de (um) tudo
o depois.



Ígor Andrade

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quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Poeira invisível (um poema quântico)

Para Marcelo Gleiser.

Assim como o universo
me encontro em expansão.
Eu vivo uma constante
de grandezas que não me cabem.

É um infinito muito de tudo
e quanto desconhecido
que tento dolorosamente descobrir
à todo instante.

Tudo em mim beira impacto
e aguarda o colapso.

Eu já existia
antes de mim mesmo.

Eu já morri
antes de nascer.

Visualizo o corpo celeste
em primaveras que não vivi
e nem viverei.

Sou muito pequeno
pro meu tempo.

Sou como o universo.
Faço parte dele.
Devo unir o verso
de cada amanhã
mesmo que deixe de existir.

Tudo que sou
será esquecido
mais cedo
ou mais tarde.

Tudo que penso
ficará na eternidade.



Ígor Andrade

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domingo, 13 de fevereiro de 2011

Meio Kant

O mundo é como é.
Eu sou como sou.
Os outros tentam
ser o que não têm.



Ígor Andrade

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Cada vez mais

Cada vez mais
todo o menos
me interessa
todo o contrário
que apressa
todo qualquer
cada vez mais
é todo menos.



Ígor Andrade

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Do medo

A cada dia perco
um pouco de alguém
que nunca tive.



Ígor Andrade

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Iluminismo

Minha imaginação
é
real.



Ígor Andrade

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sábado, 12 de fevereiro de 2011

Rua Costa Barros

Caminho na chuva
com uma certeza
se o dia é frio
aqueço a tristeza.



Ígor Andrade

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quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Adias

Há dias espero
pela poesia
pela minha
poesia.

Há dias
e há noites
que ela não vem.

Há dias
que desisto
de mim mesmo.

Há dias
que ainda assim
espero
pela minha poesia.



Ígor Andrade

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terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Gastrite nervosa

Meu estômago anda me incomodando.
Uma manada corre livre
machucando o solo
e a sala
que não pára
que não cala
nessa reforma de fora
que muda tudo por dentro.

Dentro.
O dia foi quente
e a noite é mal-estar.

Eu mal estou.
Eu estou mal.
Me inflama o juízo
esta inflamação do epitélio estomacal.

Ontem estava muito ruim.
Hoje eu piorei.
Amanhã não sei.
Um homem precisa de omeprazol...

Meu estômago anda me incomodando
e sinto raiva e saudade e ciúme
sinto até o perfume
da mulher que me deixou.

(Esta frase foi mais para enfeitar o poema.
Minha mulher não me deixou;
ela caminha com a manada aqui dentro.)

Só sei que sinto raiva
e meu estômago dói.
Como o soco que matou Houdini.
Toda ira aqui de Mussolini.
Qualquer busca do cundalini.
Onde raios está o meu herói?

Meu estômago anda me incomodando
e faz tempo.
Preciso tentar descansar
o estômago e a cabeça.

No quarto
meu irmão agoniado
lê a bíblia antes de dormir.
Amanhã como sempre
acordará pior.

Meu estômago anda me incomodando.
Preciso mesmo vomitar.



Ígor Andrade

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sábado, 5 de fevereiro de 2011

Passado

Ponho
na poesia
o porvir.



Ígor Andrade

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sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

O poema também voa

Ontem fui no aeroporto
e me ocorreu
que não preciso de asas
mas as quero.

(Não voei
e não vi voar.
E sei que o chão me incomoda.)

Quando me sinto
perto do solo
passo a odiar
quem está perto.

(Eu sei, eu não sou esperto
mas sou sonhador.)

Há quem diga
que preciso
da mulher e do céu;
e eu teimo em entender.
Quem precisa de aviões?
Os aviões foram criados por poetas.

Ontem
no aeroporto
me lembrei
que tudo é partida
e nunca chegada.
Nunca sei bem o que sentir por lá.
Nunca sei bem o que é partida.

Ontem faltou energia
e o calor era absurdo.
Quem sabe escrevi este poema
de mau humor.

Só sei que o aeroporto me faz mal
decididamente.
Mas no domingo eu volto lá.

(Pelo menos os três livros de Nietzsche
me custaram pouco
na pechincha da livraria.)



Ígor Andrade

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quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Do meu amor

Hoje eu sinto falta.
O ontem é cedo
e a noite é alta.



Ígor Andrade

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Epíteto

A noite anda
num passo lento.
À noite sinto
à noite vento.
A noite segue
e à noite sento
num mundo perdido
que não consigo enxergar.

A noite é sempre
outro lugar.
Não aqui.



Ígor Andrade

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terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Dorme

Para meu irmão Thiago Andrade.

Não há dor que dure
e nem amor que durma.

A vida não dura
um sono tranquilo
muito menos
um amor sossegado.

Não há dor que chegue
se o sono não chega.

Não há dor
nem amor
que fique guardado
para sempre.

Aprende logo
de uma vez:
o para sempre
é só hoje.



Ígor Andrade

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