"Quanto mais me elevo, menor fico aos olhos de quem não sabe voar." Friedrich Nietzsche
terça-feira, 31 de janeiro de 2012
Taxonomia
Quem não respeita
a saudade
de um beijo
não deveria entender
a dor
de silenciar.
Ígor Andrade
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Cuidadosamente
Cuidadosamente analiso meu dia.
Nada fiz.
E no nada feito
não encontrei cuidado
e nem quem me cuidar.
Tristeza de praia deserta.
Nem sei direito o que sentir.
Devo admitir cuidadosamente
que um sono prolongado me cairia bem.
Cair aliás é minha especialidade.
Consigo cair já estando caído.
Cuidadosamente analiso meu dia
e este poema medíocre.
Não vejo exagero, vejo prostração.
Muita sombra e pouca ação.
Sobra eu depois do ponto final.
Cuidadosamente penso como um assassino
e cuidadosamente concluo como um suicida.
Bato na palavra já batida até enjoar do som...
Cuidadosamente hoje estou com preguiça de mim.
Ígor Andrade
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domingo, 29 de janeiro de 2012
Incomprehensibìlis
Eu acho que hoje não acordei. Um agora que parece ontem. Talvez tenha sido a noite, na certeza que tenho sido o que ando sendo. Porque sou, ainda que na teimosia, e porque tenho tudo quanto quero. No fundo de minhas teorizações eu só espero minha mulher voltar pra minha cama. E é aí que a trama vira desgrama. Não sei se estou escrevendo ou sonhando. Sigo meu pensamento pela sala, vou caminhando, sem deixar derramar o café. Meu pé está gelado, enquanto minha mão esquenta. Do outro lado da rua alguém desiste, e o eu do outro lado de mim não se aguenta. Sinto é saudade. A conformidade de lembrar e ainda querer é tudo que me escreve. O ignorante ainda vive. O vento ainda é leve. Levem de mim esta folha em branco. Hoje não me sinto tão vazio quanto a rua. O banco da praça tem lá seu aconchego, e passei tão longe de lá. Pode faltar qualquer coisa nesta noite, mas a lembrança não me deixa esperar. Estou escrevendo uma lógica que não quero entender. Estou entendendo um alguém que não quero esquecer. Hoje bem longe de mim ficou a filosofia sobre a morte.
Ígor Andrade
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sábado, 28 de janeiro de 2012
Talvez você
Sou o mesmo.
Sou mesmo.
Sou.
Mas quem não é
sem o mesmo?
Ígor Andrade
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quarta-feira, 25 de janeiro de 2012
Magníloquo brincante
Para a amiga e companheira nas palavras, Talita Prates.
O quarto
o quanto antes
o quente
em eloquentes pontes
o quântico
enquanto dentes
e quando mentes
quantitativas fontes.
O quarto sem laços
e metades-
metonímia de noites
e poesia.
A voz e o quarto
de nós ausente.
Tudo sabe
quem tudo sente.
A ópera das reticências
em órbitas de estesia...
Ígor Andrade
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segunda-feira, 23 de janeiro de 2012
Meio quarteirão
Caminho entre
a marginalidade e a loucura.
A insanidade é uma pintura.
Poesia boa é agrura.
Verso versado no inverso.
Loucura.
Meio quarteirão de linha pura.
Calçada clara e escura.
O amor é altura.
Toda dor não cura.
Antes de qualquer esquina
o que não fere amargura.
Ígor Andrade
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domingo, 22 de janeiro de 2012
Parei na esquina
O peito cansado e rouco.
A rua escura e vazia.
E eu não sabia
onde me encontrar.
Onde não me encontrei
no tempo
com pouco espaço.
Eu me refaço
é na poesia.
Passando a noite
e passado o dia.
Eis que o pouco que penso
só pode ser presente.
Estou ausente de mim
inerte na frente do fronte.
Aponta pra longe e segue.
A ponte é a fonte
e nós nos atravessamos.
Somos e fomos
cada bendito dia
que amanhece e passa.
A saudade vira fumaça
e deixo o vento levar.
Deixa a chuva lavar o juízo.
A cura só vem com a morte.
Sou fraco ao mesmo tempo que sou forte.
O prejuízo da dor transcende o aprendizado.
Para cada verso largado
na esquina de cada calçada
penso numa morada
que desencontra o averso de mim.
Sou assim:
um pouco de tudo
que nunca vi.
Ígor Andrade
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Perto demais
Longe de mim
o domingo
em que anoitece
cada lembrança.
Longe de tudo
e dormindo
não desaparece
toda esperança.
Ígor Andrade
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quarta-feira, 18 de janeiro de 2012
Mar em fúria
A madrugada me acolhe
me encolhe
talvez
na mesma proporção.
Proposição de um cárcere.
Preposição do silêncio.
Tudo que é grade
fica grande
no escuro.
Imagino que descanso
é algo tão distante
que ninguém consegue tocar
com os olhos.
Fascina-me o entendimento do vazio
e toda agonia do desespero
alheio.
(Eu meio que estou de saco cheio
de tentar esquecer o que escrevo...)
Acredito que tudo que é verdadeiro
nem chega nos olhos
de quem não é poeta.
Hoje desenhei o olho de Hórus no teto do meu quarto.
Ígor Andrade
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sábado, 14 de janeiro de 2012
Lampejo
Examinar o improvável
com cara de manhã.
Sentir que o lugar certo
pode ser a pessoa errada.
Revelar angústias
para sua janela.
Tomar café na xícara nova.
Ler um livro que trata do seu passado.
Não pensar no outro futuro.
Amanhecer longe daqui.
Eis o que nasci pra fazer: escrever.
Ígor Andrade
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quarta-feira, 11 de janeiro de 2012
Onírico demais
Não estou dormindo bem.
O sono tranquilo, que era
tudo que eu tinha
cansou de mim.
Os reflexos da minha vida estão alterados.
Alter ego que me espia atrás da porta
com uma faca na mão.
De antemão concluo:
Posso eu me matar antes de mim...
Minha casa desarmonizou.
Minha mãe se deprimiu.
Meu irmão se extenuou.
Meu cachorro adoeceu.
Cadê o sorriso da caminhada?
Cadê o pacifismo do novo eu?
Talvez ajude meditar sobre a tarde.
Talvez ajude me ditar antes da noite.
Não estou dormindo bem.
Meu sono não tem vaidade com o ronco.
Cavalo manco preto-e-branco
que desaprendeu a correr.
Vou pastar algumas horas
antes de acordar mesmo.
Escrevo dormindo tudo que queria esquecer.
O ponto de impacto!
De repente deixo a tarde ir.
O que há de se fazer?
Com uma serenidade de bolso vazio
e uma agonia de pedra
permito-me um pouco mais
que lembranças do que não existiu.
Ígor Andrade
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segunda-feira, 9 de janeiro de 2012
Ignorance revealed
Uma dor fortíssima no peito.
Sujeito desdentado de poesia.
Põe o sal na mesa,
antes do prato a incerteza
e esquece de se lavar na pia.
Todo mundo parece que sabe.
Eu não sabia.
Alguém em algum lugar sente
que alguém em outro lugar não sentia.
Uma dor maior que antes.
Uma dor maior que a minha.
Sem drama
reabilito a história da minha vida
na cama.
A trama engrossa.
Tanta cidade dentro de mim
tanta fome na minha roça.
Uma hora na varanda
olhando a lua cheia
e uma conclusão e meia:
Há toda uma convicção libertária na solidão.
Vai-se tudo nesta vida.
Ficam o vil e o vão.
E as reticências
dos sentidos opostos.
Hoje um nada de cada vez
para atentar os dispostos...
Ígor Andrade
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quinta-feira, 5 de janeiro de 2012
Por causa dela
O dia de hoje tem a mesma janela
fria, aberta e sem muito verde.
Dia que se perde
quando começa.
Ver de longe que não adianta pressa
porque sou o sujeito mais lento.
Eu tento, isso é verdade
e sinto que qualquer vontade
passa.
Um certo dia no mês de janeiro
arregaça as mangas
mas esqueceu das calças.
Vestir-se de impaciência
e passar vergonha no meio da rua.
Sorriu pra mim meu cão.
Chorei sobre minha memória nua.
Há dias que se dividem em dois:
Um dos justos
que nada ganham.
E outro dos impossíveis
que nada perdem.
Acordo e antes de dormir
reconheço
que ando dando voltas
no meio do caminho.
Ígor Andrade
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quarta-feira, 4 de janeiro de 2012
Meu negócio é o ócio
Hoje
não fiz nada demais.
Hoje
eu sofri de menos.
Ígor Andrade
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Dia Quatro
A tarde é quente
porque a lembrança é fria.
Toda mulher desconfia
de um homem sobrevivente.
O homem vivo mente
mas sente saudade.
A mulher morta
na própria vaidade
nem imagina e nem sabe
que toda teimosia caduca
transcende da distância.
Estância que arroga para si
todas as razões do universo.
Verso ferido por orgulho.
Mergulho
que acaba em afogamento.
Dia quatro que parece lamento.
Lá muito
longe atravessa o mundo
um animal faminto.
Um dia de quatro patas
que não chega a lugar algum.
Ígor Andrade
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Pôr do Sol
O sol toca o mar
enquanto escrevo seu nome
nas pedras.
Sim: o céu é perto
e eu sou tão pequeno
e você é tão grande.
enquanto escrevo seu nome
nas pedras.
Sim: o céu é perto
e eu sou tão pequeno
e você é tão grande.
Eu amo esse amor, sabia?
Esse amor que é um oceano
em que navego
e afundo.
Esse amor que é um oceano
em que navego
e afundo.
Todo horizonte é bonito
e laranja
quando se olha
com os olhos do seu amor.
e laranja
quando se olha
com os olhos do seu amor.
Ígor Andrade
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